Procuro trabalhar com o empoderamento das pessoas que estão no lugar de serem empoderadas. Sempre que há um conflito, falta empoderamento. Sempre que alguém se considera vítima, falta empoderamento, falta poder pessoal para a pessoa. Ela não está exercendo o seu lugar com plenitude.
Os pais, quando querem delegar uma solução, uma decisão relativa à família, relativa aos filhos, para um terceiro, seja um advogado, mediador ou juiz, estão fragilizados em seu lugar de pais, e isso é prejudicial aos filhos. Mas é assim. As famílias, em geral, não são perfeitas. Logo, qualquer um está sujeito a precisar do auxílio de terceiros, a não conseguir se entender com alguém que um dia amou.
Quando os pais não querem conversar diretamente, não querem olhar-se nos olhos, quando não há diálogo entre eles, diigo-lhes o seguinte: "Olha, para decidir a guarda dos filhos ou o regime de visitas, vocês precisam se entender, porque, se eu der uma decisão com a qual pelo menos um dos dois não esteja de acordo, vocês continuarão tendo problemas. É uma ilusão achar que eu vou resolver. Se não tiver comunicação entre vocês, vou determinar o regime de guarda e o regime de visitas, os dias que vai ficar com o pai e os dias que vai ficar com a mãe. Se um dia um atrasar, já vai dar problema, já vai ter queixa: — Ah, ele combinou e atrasou. Aí vai ter queixa do outro porque ele combinou, foi embora e devolveu o filho num horário inadequado. Quando as férias chegarem, como serão resolvidas? Vai ter briga para ver quem fica no Natal, quem fica no Ano Novo. Há tantas questões que vocês precisam resolver em relação aos filhos, por isso, a comunicação eficaz entre os pais é fundamental. É indelegável. Vocês precisam se comunicar."
Então, as partes respondem: "Ah não, mas a gente não se fala, porque não dá certo. Decide aí, doutor". Ao que respondo de maneira incisiva: "Gente, é lição de casa de vocês. Vocês precisam se comunicar."
Diante desse contexto, como convencê-los? Como se diz na Justiça Restaurativa: "devolver os conflitos aos seus donos". Os donos dos conflitos são eles, são as partes envolvidas.
Se eu quiser dar uma solução, serei um terceiro que não sei nada da realidade deles, e não estarei lá no dia a dia. Não posso estar nesse lugar. Tenho que ser um facilitador para que possam estar no lugar de quem resolve seus próprios problemas, para que não fiquem me procurando de novo e de novo.
Por isso, falo para eles: "Se eu tomar uma decisão em relação ao que vocês vão fazer com o filho de vocês, essa decisão inclui em que escola ele vai estudar, onde vai morar. São assuntos que os pais têm que decidir. Se vocês me pedirem para decidir, como os seus filhos vão olhar para vocês? Vão olhar para vocês e vão enxergar vocês pequenininhos. Não vão enxergar vocês grandes, como pais que oferecem segurança, que cuidam dos filhos. Vão enxergar vocês como pais que não conseguem cuidar dos filhos, que não conseguem resolver as coisas dos filhos." Mostro para eles que essa atitude gera insegurança, gera falta de firmeza.
A mãe terá de dizer ao filho: "Olha, filho, você vai ficar com o papai no final de semana porque o juiz falou. O papai vai pagar tanto porque o juiz falou". Enquanto o pai vai dizer para ele: "Olha filho, está bem legal aqui, a gente está se divertindo, mas agora você tem que voltar para a casa da mamãe porque o juiz falou e, se você não voltar, vai dar problema."
Mostro-lhes, enfim, que, se for assim, o juiz é o grande nessa história, enquanto os pais são pequenininhos, os pais não resolvem nada. Assim, o filho não irá julgá-los como pais, porque irá considerá-los pequenos. Além disso, irá se ressentir da falta de pais grandes. Isso terá reflexos no respeito, na consideração, na força, no desenvolvimento dos filhos.
Os filhos ficarão dependentes da Justiça. Olha o padrão que se está ensinando para os filhos… Eles entenderão que, para resolver as suas demandas pessoais, devem reclamar para outra pessoa, em vez de conversar. Os reflexos são sistêmicos.
Depois de explicar tudo isso, questiono novamente os pais: "É isso que vocês querem? Vocês querem que eu decida para que fiquem como os pequenininhos da história? Ou vocês querem crescer nessa situação, assumir o lugar de pai e mãe, vencer as dificuldades que vocês tiverem, superar isso, para conversar, se comunicar, poderem olhar para os filhos e os filhos poderem olhar para vocês como grandes. Nesse caso, poderão dizer para os filhos: — Nós decidimos que vai ser assim."
Às vezes, peço-lhes para imaginarem que olham para os filhos e dizem: Vocês vão ficar com a mamãe porque o juiz falou. Vocês vão ficar, durante o final de semana, com o papai porque o juiz falou." Em seguida, pergunto-lhes como se sentem. Pergunto-lhes, também, como os filhos se sentem. Então, peço-lhes que imaginem que estão olhando para os filhos entre eles. Depois disso, peço-lhes que se imaginem se olhando e se reconheçam como o pai e a mãe, e em seguida digam: "Nós vamos decidir. Os filhos são nossos". Em seguida, peço que olhem para os filhos e digam: "Nós vamos decidir como vai ser, fiquem tranquilos. Vocês têm um pai e uma mãe. Vocês vão ficar conosco e nós resolvemos. Não se preocupem". Por fim, questiono-lhes como se sentem. E também como os filhos se sentem. Digo-lhes ainda: "Se vocês fizeram esse exercício, puderam sentir que, imediatamente, quando disseram isso, vocês cresceram e os filhos se sentiram seguros, os filhos se sentiram despreocupados, porque vocês estão no controle. Vocês são grandes."
Esse é um exemplo de trabalho para empoderar as partes envolvidas. É claro que isso é uma nova postura do juiz. Eu mesmo, quando ajo assim, estou renunciando a ser o grande, a ser o poderoso diante desse relacionamento, de ser quem decide, porque o juiz que resolve tudo na caneta tem o poder, mas, em contrapartida, alimentará a relação de dependência das pessoas em relação à Justiça, e não é isso o que buscamos.
(Texto extraído do curso online Direito Sistêmico e as Constelações Familiares na resolução de conflitos, com o Dr. Sami Storch)